Como e quando surgiu a devoção e a romaria? Há várias versões que narram à devoção a Nossa Senhora d´Abadia do Muquém. A litero-lendária versão do romancista e juiz da Comarca de Catalão-GO, é de Bernardo Guimarães. Em Ermitão do Muquém (1858), Bernardo narra a origem a partir de Gonçalo e salvo por um medalhão de Nossa Senhora veio morar no Muquém de Goiás. Ali, se tornou um ermitão. A historiadora Megale (1997), fala do surgimento de um quilombo nas Serras do Muquém. Os escravos foragidos das minas auríferas de Cocal, Água Quente, Traíras e São José do Tocantins, formaram o Quilombo do Muquém. Uma companhia de homens armados e liderados por um capitão de mato capturou os quilombolas e mandou construir no local uma capelinha em homenagem ao santo do dia, São Tomé Apóstolo.
Os bispos da Diocese de Uruaçu-GO, Dom Francisco Prada Carrijo (1978) e Dom José Silva Chaves (2003) relatam, com a chegada de novos aventureiros ao Arraial do Muquém, um homem vindo de Portugal instalou-se na região em busca de ouro. E, em tal aperto, caso fosse livre da acusação, prometeu buscar de Portugal a imagem de Nossa Senhora e depositá-la na capelinha do Arraial. O português tendo recebido o milagre, cumpriu o seu voto. O padre Daniel da Silva Rocha, vigário de São José do Tocantins (atual Niquelândia-GO) e responsável pela romaria nos anos 1859 a 1872, escreve uma carta informando o bispo de Goiás, Dom Joaquim Gonçalves Azevedo (1867). O reverendo escreve que a imagem de Nossa Senhora chegou ao Muquém em 1748, fora trazida pelo português Antônio Antunes de Carvalho e acompanhada por famílias e escravos, procedentes da Bahia.
O romeiro Nicanor Azevedo (2018) guarda à tradição oral. Ele fala que nas Matas do Muquém morava um velho ermitão. Este homem vinha à Freguesia de São José do Tocantins e sempre trazia uma botija de água e outra de ouro. O velho piedoso rezava e benzia os doentes com a água do Córrego do Muquém e ficavam curados. O ouro era distribuído aos pobres. Os moradores curiosos por saberem quem era e onde morava, certa vez, seguiram o homem até chegar as Matas do Muquém. Ali, encontraram uma capelinha simples e o medalhão com a imagem de Nossa Senhora. Há contos, romeiros narram que a imagem de Nossa Senhora fora achada nas Serras do Muquém, e que ao levarem para à cidade, ela retornava ao local da gruta.
As versões apresentadas não se contradizem, mas sim, se convergem e se complementam de informações lendárias, históricas, geográficas, culturais, folclóricas e religiosas e ajudam a entender a origem da devoção a Nossa Senhora d´Abadia no Sertão de Goiás.
Por que o nome Nossa Senhora d´Abadia do Muquém? O iniciador da devoção foi o português Antônio Antunes de Carvalho. Ele fez o voto de que se fosse livre de tal situação da qual fora acusado à Corte Portuguesa, viajaria a sua terra natal. Lá, no norte de Portugal, ele adquiriu uma imagem no Mosteiro de Nossa Senhora d´Abadia de Bouros. Abadia, significa que o superior e responsável pelos monges era o Abade. Antônio adquiriu a imagem de Nossa Senhora, atravessou o Oceano Atlântico em transporte de barco à vela e aportou em São Salvador da Bahia de Todos os Santos (atual Salvador-BA). De Salvador viajou pelo interior da Bahia, percorreu o Caminho dos Currais do Vale de São Francisco, conhecida Estrada Geral do Sertão até o Arraial dos Couros (atual Formosa-GO) no Planalto Central. A comitiva de Antônio chegou ao Arraial do Muquem em 1748. A imagem Nossa Senhora d´Abadia fora colocada na Capelinha de São Tomé como pagamento do voto. Muquém, representa uma técnica indígena, ou seja, uma grelha feita de varas para assar carne sobre o braseiro.
O brigadeiro Cunhas Mattos em Chorographia Histórica da Provincia de Goyaz (1824) narra, para este lugar sagrado e significativo de fé, milagres, curas e benção acorreram milhares de pessoas. Eram sozinhas ou em grupos, elas vinham dos recantos mais afastado não só da Província de Goiás, mas das províncias de Minas Gerais, Mato Grosso, São Paulo, Bahia, Pará e Maranhão. A fama se espalhou e o Muquém tornou-se o centro popular de devoção, peregrinação e romaria e anualmente, festejada no dia 15 de agosto. Ai, surge a religião popular em torno da devoção a Nossa Senhora d´Abadia, uma expressão do catolicismo tradicional e popular. A devoção nasce do cumprimento do voto de Antônio Antunes de Carvalho; nasce das buscas, práticas e experiências religiosas do povo, predominantemente, dos leigos e das leigas; nasce dos dirigentes eclesiásticos, diáconos, sacerdotes e bispos, promovem os atos de culto, liturgia e controle do que a Igreja Católica considerava sagrado, inadequado ou profano.
A devoção Nossa Senhora d´Abadia do Muquém localiza-se, especificamente, na região do Centro Oeste Brasileiro e Planalto Central e faz-se presente em diversos Estados do Brasil e em países onde existem brasileiros devotos. Onde realiza-se a romaria? Ao contrário das romarias urbanas, a romaria acontece no meio rural à 45 quilômetros da cidade de Niquelândia-GO. O ponto fixo da romaria é o Santuário. A romaria constrói uma cidade temporária na região rural do Muquém, um fluxo populacional acima de 400 mil pessoas. A romaria realiza-se num ecossistema histórico, social, cultural, simbólico e religioso.
Quando e onde surgiram as romarias cristãs? Elas surgiram quando o Cristianismo se tornou a religião oficial do Império Romano no século IV. O romeiro refere-se uma pessoa que viajava a cidade de Roma para visitar o tumulo dos mártires Pedro e Paulo e outros Santos, martirizados no século I do Cristianismo. Daí surgiram os termos “romaria” e “romeiro”. A “peregrinação” vem do termo “peregrino”, significa uma pessoa que viajava para longe de casa com motivos religiosos. Portanto, os termos romeiro e peregrino expressam os mesmos ideais de busca, sentido, mística e experiência religiosa a um lugar sagrado ou santuário. Desta forma, quando se diz “Romeiro do Muquém”, refere-se àquela pessoa que vem ao lugar sagrado (santuário) e vivencia as práticas religiosas. Existem inúmeras motivações para o romeiro entrar na geografia sagrada do santuário e da romaria, e junto a estas motivações, existem uma infinitude de desejos, satisfações, participação e justificativas. Por certo e talvez, os romeiros não vêm ao Muquém somente pela devoção ou pelo sagrado, mas sim são motivados por expectativas sociais, familiares, culturais, políticas, econômicas, turísticas e tantas outras que dão sentidos diferentes à sua participação na romaria e à permanência na festa da padroeira.
Venha conhecer e visitar este lugar sagrado, místico e encantado. Participe do ousado projeto em preparação aos 300 anos de Devoção a Nossa Senhora d´Abadia do Muquém (1748-2048). Inscreva-se em nosso canal digital. Faça parte do nosso sonho de chegar em 2048 com uma romaria mais fervorosa na fé, mais inovadora nas estruturas e mais esperançosa na devoção.
Nossa Senhora d´Abadia te guia, proteja e abençoa.
Pe. Dr. Aldemir Franzin
Reitor do Santuário